sábado, 5 de novembro de 2016

43 - O VINHO NOS TEMPOS DO NOVO TESTAMENTO (1)


Lc 7:33-34: “Porque veio João o Batista, que não comia pão nem bebia vinho, e dizeis: Tem demônio; Veio o Filho do homem, que come e bebe, e dizeis: Eis aí um homem comilão e bebedor de vinho, amigo dos publicanos e pecadores.”   
VINHO: FERMENTADO OU NÃO FERMENTADO?
            Segue um exame da palavra bíblica mais comumente usada para vinho. A palavra grega para “vinho”, em Lucas 7.33, é oinos. Oinos pode referir-se a dois tipos bem diferentes de suco de uva: Suco não fermentado, e vinho fermentado ou embriagante. Esta definição apóia-se nos dados abaixo:
1)      A palavra grega oinos era usada pelos autores seculares e religiosos, antes da era cristã e nos tempos da igreja primitiva, em referência ao suco fresco de uva.
  1. Anacreontes (cerca de 500 a.C.) escreve: “Esprema a uva, deixe sair o vinho [oinos]”.
  2. Nicandro (século ll a.C.) escreve a respeito de espremer uvas e chama de oinos o suco daí produzido.
  3. Papias (60-130 d.C), um dos pais da igreja primitiva, menciona que quando as uvas são espremidas produzem “jarros de vinho [oinos]”, citado por Irineu em seu livro, Contra as Heresias.
  4. Uma carta em grego escrita em papiro (137 d.C.), fala de “vinho [oinos] fresco, do tanque de espremer”.
  5. Ateneu (200 d.C.) fala de um “vinho [oinos] doce”, que “não deixa a cabeça pesada”. Escreve também, a respeito de um homem que colhia uvas “acima e abaixo, pegando vinho [oinos] no campo.”
2)      Os judeus que traduziram o AT do hebraico para o grego (200 a.C) empregaram a palavra oinos para traduzir várias palavras hebraicas que significam vinho. Noutras palavras os escritores do NT entendiam que oinos pode referir-se ao suco de uva, com ou sem fermentação.
3)      Quanto à literatura grega secular e religiosa, um exame dos trechos do NT também revela que oinos pode significar vinho fermentado, ou não fermentado. Em efésios 5.18, o mandamento: “E não vos embriagueis com vinho [oinos], em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito;” refere-se ao vinho alcoólico. Por outro lado, em Apocalipse 19.15 Cristo é descrito pisando o lagar. O texto grego diz: “e ele mesmo é o que pisa o lagar do vinho [oinos]”, o oinos que sai do lagar é o suco de uva. Em Apocalipse 6.6, oinos refere-se às uvas da videira como uma safra que não deve ser destruída. Logo, para os crentes dos tempos do NT, “vinho [oinos]” era uma palavra genérica que podia ser usada para duas bebidas distintivamente diferentes, extraídas da uva: o vinho fermentado e o não fermentado.
4)      Finalmente, os escritores romanos antigos explicam com detalhes vários processos usados para tratar o suco de uva recém-espremido, especialmente as maneiras de evitar a fermentação.
  1. Columela, sabendo que o suco de uva não fermenta quando mantido frio (abaixo de 10°C) e livre de oxigênio, escreve da seguinte maneira: “Para que o suco de uva sempre permaneça tão doce como quando produzido, siga estas instruções: Depois de aplicar à prensa às uvas, separe o mosto mais novo [isto é. Suco fresco], coloque-o num vasilhame (amphora) novo, tampe-o e revista-o muito cuidadosamente com piche para não deixar a mínima gota de água entrar; em seguida, mergulhe-o numa cisterna ou tanque de água fria, e não deixe nenhuma parte da ânfora ficar acima da superfície. Tire a ânfora depois de quarenta dias. O suco permanecerá doce durante um ano”. O escritor Plínio (século l d.C.) escreve: “Tão logo tiram o mosto [suco de uva] do lagar, colocam-no em tones, deixam estes submersos na água até passar a primeira metade do inverno, quando o tempo frio se instala”. Este método deve ter funcionado bem na terra de Israel. “Porque o Senhor, teu Deus, te mete numa boa terra, terra de ribeiros de águas, de fontes e de abismos, que saem dos vales e das montanhas” (Dt 8.7; 11.11,12; Sl 65.9-13).
  2. Outro método de impedir a fermentação das uvas é fervê-las e fazer um xarope. Historiadores antigos chamavam esse produto de “vinho [oinos]”. O novo dicionário da Bíblia (p. 1665) observa que “sempre havia meios de conservar doce o vinho durante o ano inteiro”.
O USO DO VINHO NA CEIA DO SENHOR
      Jesus usou uma bebida fermentada ou não fermentada de uvas ao instituir a Ceia do Senhor (Mt 26.26-29; Mc 12.22-25; Lc 22.17-20; 1Co 11.23-26)? Os dados abaixo levam à conclusão de que Jesus e seus discípulos beberam no dito ato suco de uva não fermentado.
  1. Nem Lucas, nem qualquer outro escritor bíblico emprega a palavra “vinho [oinos]” no tocante à Ceia do Senhor. Os escritores dos três primeiros Evangelhos empregam a expressão “fruto da vide”, “E digo-vos que, desde agora, não beberei deste fruto da vide, até aquele dia em que o beba novo convosco no reino de meu Pai.” (Mt 26.29; Mc 14.25; Lc 22.18). O vinho não fermentado é o único “fruto da vide” verdadeiramente natural, contendo aproximadamente 20% de açúcar e nenhum de álcool. A fermentação destrói boa parte do açúcar e altera aquilo que a videira produz. O vinho fermentado não é produzido pela videira.
  2. Jesus instituiu a Ceia do Senhor quando Ele e seus discípulos estavam celebrando a Páscoa. A Lei da Páscoa em Êxodo 12.14-20 proibia, durante a semana daquele evento, a presença de seor (Êx 12.15), palavra hebraica para fermento ou qualquer agente fermentador. “Sete dias comereis pães asmos; ao primeiro dia tirareis o fermento das vossas casas; porque qualquer que comer pão levedado, desde o primeiro até ao sétimo dia, aquela alma será cortada de Israel.”. Seor, no mundo antigo, era freqüentemente obtido da espuma espessa da superfície do vinho quando em fermentação. Além disso, todo o hametz (isto é, coisa fermentada) era proibido (Êx 12.19; 13.7). Deus dera essas leis porque a fermentação simbolizava a corrupção e o pecado (Mt 16.6,12; 1Co 5.7,8). E Jesus, o Filho de Deus, cumpriu a Lei em todas as suas exigências “Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir.” (Mt 5.17). Logo, teria cumprido a Lei de Deus para a Páscoa, e não teria usado vinho fermentado.
  3. Um intenso debate perpassa os séculos entre os rabinos e estudiosos judaicos sobre a proibição ou não dos derivados fermentados da videira durante a Páscoa. Aqueles que sustentam uma interpretação mais rigorosa e literal das Escrituras hebraicas, especialmente Êxodo 13.7, declaram que nenhum vinho fermentado devia ser usado nessa ocasião.
  4. Certos documentos judaicos afirmam que o uso do vinho não fermentado na Páscoa era comum nos tempos do NT. Por exemple: “Segundo os Evangelhos Sinópticos, parece que no entardecer da quinta-feira da última semana de vida aqui, Jesus entrou com seus discípulos em Jerusalém, para com eles comer a Páscoa na cidade santa; neste caso, o pão e o vinho do culto de Santa Ceia instituído naquela ocasião por Ele, como memorial, seria o pão asmo e o vinho não fermentado do culto de Ceia” (The Jewish Encyclopaedia, edição 1904).
  5. No AT, bebidas fermentadas nunca deviam ser usadas na casa de Deus, e um sacerdote não podia chegar-se a Deus em adoração se tomasse bebida embriagante (Lv 10.9). Jesus Cristo foi o Sumo Sacerdote de Deus do novo concerto, e chegou-se a Deus em favor do seu povo (Hb 3.1; 5.1-10).
  6. O valor de um símbolo se determina pela sua capacidade de conceituar a realidade espiritual. Logo, assim como o pão representava o corpo puro de Cristo e tinha de ser pão asmo (isto é, sem a corrupção da fermentação), o fruto da vide, representando o sangue incorruptível de Cristo, seria melhor representado por suco da uva não fermentado “Sabendo que não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados da vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos pais, Mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado” (1Pe 1.18,19). Uma vez que as Escrituras declaram explicitamente que o corpo e sangue de Cristo não experimentaram a corrupção (Sl 16.10; At 2.27; 13.37), esses dois elementos são corretamente simbolizados por aquilo que não é corrompidos nem fermentado.
  7. Paulo determinou que os coríntios tirassem dentre eles o fermento espiritual, isto é, o agente fermentador “da maldade e da malícia” porque Cristo é nossa Páscoa (1Co 5.6-8). Seria contraditório usar na Ceia do Senhor um símbolo da maldade, isto é, algo contendo levedura ou fermento, se considerarmos os objetivos dessa ordenança do Senhor bem como as exigências bíblicas para delas participarmos.
Amém!

Erivelton de Jesus

Nenhum comentário:

Postar um comentário