Lc 7:33-34: “Porque veio João o Batista, que não comia
pão nem bebia vinho, e dizeis: Tem demônio; Veio o Filho do homem, que come e
bebe, e dizeis: Eis aí um homem comilão e bebedor de vinho, amigo dos
publicanos e pecadores.”
VINHO: FERMENTADO OU
NÃO FERMENTADO?
Segue um exame da palavra bíblica
mais comumente usada para vinho. A palavra grega para “vinho”, em Lucas 7.33, é
oinos. Oinos pode referir-se a dois
tipos bem diferentes de suco de uva: Suco não fermentado, e vinho fermentado ou
embriagante. Esta definição apóia-se nos dados abaixo:
1)
A
palavra grega oinos era usada pelos autores seculares e religiosos, antes da
era cristã e nos tempos da igreja primitiva, em referência ao suco fresco de
uva.
- Anacreontes (cerca de 500 a.C.) escreve: “Esprema
a uva, deixe sair o vinho [oinos]”.
- Nicandro (século ll a.C.) escreve a respeito de
espremer uvas e chama de oinos o suco daí produzido.
- Papias (60-130 d.C), um dos pais da igreja
primitiva, menciona que quando as uvas são espremidas produzem “jarros de vinho
[oinos]”, citado por Irineu em seu livro, Contra as Heresias.
- Uma carta em grego escrita em papiro (137 d.C.),
fala de “vinho [oinos] fresco, do tanque de espremer”.
- Ateneu (200 d.C.) fala de um “vinho [oinos] doce”,
que “não deixa a cabeça pesada”. Escreve também, a respeito de um homem
que colhia uvas “acima e abaixo, pegando vinho [oinos] no campo.”
2)
Os
judeus que traduziram o AT do hebraico para o grego (200 a.C) empregaram a
palavra oinos para traduzir várias palavras
hebraicas que significam vinho. Noutras palavras os escritores do NT entendiam
que oinos pode referir-se ao suco de
uva, com ou sem fermentação.
3)
Quanto
à literatura grega secular e religiosa, um exame dos trechos do NT também
revela que oinos pode significar
vinho fermentado, ou não fermentado. Em efésios 5.18, o mandamento: “E não vos embriagueis com vinho [oinos], em
que há contenda, mas enchei-vos do Espírito;” refere-se ao vinho alcoólico.
Por outro lado, em Apocalipse 19.15 Cristo é descrito pisando o lagar. O texto
grego diz: “e ele mesmo é o que pisa o
lagar do vinho [oinos]”, o oinos que sai do lagar é o suco de uva. Em
Apocalipse 6.6, oinos refere-se às uvas da videira como uma safra que não deve
ser destruída. Logo, para os crentes dos tempos do NT, “vinho [oinos]” era uma palavra genérica que podia ser usada para
duas bebidas distintivamente diferentes, extraídas da uva: o vinho fermentado e
o não fermentado.
4)
Finalmente,
os escritores romanos antigos explicam com detalhes vários processos usados
para tratar o suco de uva recém-espremido, especialmente as maneiras de evitar
a fermentação.
- Columela, sabendo que o suco de uva não fermenta
quando mantido frio (abaixo de 10°C) e livre de oxigênio, escreve da
seguinte maneira: “Para que o suco de uva sempre permaneça tão doce como
quando produzido, siga estas instruções: Depois de aplicar à prensa às
uvas, separe o mosto mais novo [isto é. Suco fresco], coloque-o num
vasilhame (amphora) novo, tampe-o e revista-o muito cuidadosamente com
piche para não deixar a mínima gota de água entrar; em seguida, mergulhe-o
numa cisterna ou tanque de água fria, e não deixe nenhuma parte da ânfora
ficar acima da superfície. Tire a ânfora depois de quarenta dias. O suco
permanecerá doce durante um ano”. O escritor Plínio (século l d.C.)
escreve: “Tão logo tiram o mosto [suco de uva] do lagar, colocam-no em
tones, deixam estes submersos na água até passar a primeira metade do
inverno, quando o tempo frio se instala”. Este método deve ter funcionado
bem na terra de Israel. “Porque o
Senhor, teu Deus, te mete numa boa terra, terra de ribeiros de águas, de
fontes e de abismos, que saem dos vales e das montanhas” (Dt 8.7;
11.11,12; Sl 65.9-13).
- Outro método de impedir a fermentação das uvas é
fervê-las e fazer um xarope. Historiadores antigos chamavam esse produto
de “vinho [oinos]”. O novo dicionário da Bíblia (p. 1665) observa que
“sempre havia meios de conservar doce o vinho durante o ano inteiro”.
O USO DO VINHO NA CEIA DO SENHOR
Jesus usou uma
bebida fermentada ou não fermentada de uvas ao instituir a Ceia do Senhor (Mt
26.26-29; Mc 12.22-25; Lc 22.17-20; 1Co 11.23-26)? Os dados abaixo levam à
conclusão de que Jesus e seus discípulos beberam no dito ato suco de uva não
fermentado.
- Nem Lucas, nem qualquer outro escritor bíblico
emprega a palavra “vinho [oinos]”
no tocante à Ceia do Senhor. Os escritores dos três primeiros Evangelhos
empregam a expressão “fruto da
vide”, “E digo-vos que, desde agora, não beberei deste fruto da vide, até
aquele dia em que o beba novo convosco no reino de meu Pai.” (Mt
26.29; Mc 14.25; Lc 22.18). O vinho não fermentado é o único “fruto da
vide” verdadeiramente natural, contendo aproximadamente 20% de açúcar e
nenhum de álcool. A fermentação destrói boa parte do açúcar e altera
aquilo que a videira produz. O vinho fermentado não é produzido pela
videira.
- Jesus instituiu a Ceia do Senhor quando Ele e
seus discípulos estavam celebrando a Páscoa. A Lei da Páscoa em Êxodo
12.14-20 proibia, durante a semana daquele evento, a presença de seor (Êx 12.15), palavra hebraica
para fermento ou qualquer agente fermentador. “Sete dias comereis pães asmos; ao primeiro dia tirareis o fermento
das vossas casas; porque qualquer que comer pão levedado, desde o primeiro
até ao sétimo dia, aquela alma será cortada de Israel.”. Seor, no
mundo antigo, era freqüentemente obtido da espuma espessa da superfície do
vinho quando em fermentação. Além disso, todo o hametz (isto é, coisa
fermentada) era proibido (Êx 12.19; 13.7). Deus dera essas leis porque a
fermentação simbolizava a corrupção e o pecado (Mt 16.6,12; 1Co 5.7,8). E
Jesus, o Filho de Deus, cumpriu a Lei em todas as suas exigências “Não cuideis que vim destruir a lei ou
os profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir.” (Mt 5.17). Logo, teria
cumprido a Lei de Deus para a Páscoa, e não teria usado vinho fermentado.
- Um intenso debate perpassa os séculos entre os
rabinos e estudiosos judaicos sobre a proibição ou não dos derivados
fermentados da videira durante a Páscoa. Aqueles que sustentam uma
interpretação mais rigorosa e literal das Escrituras hebraicas,
especialmente Êxodo 13.7, declaram que nenhum vinho fermentado devia ser
usado nessa ocasião.
- Certos documentos judaicos afirmam que o uso do
vinho não fermentado na Páscoa era comum nos tempos do NT. Por exemple: “Segundo
os Evangelhos Sinópticos, parece que no entardecer da quinta-feira da
última semana de vida aqui, Jesus entrou com seus discípulos em Jerusalém,
para com eles comer a Páscoa na cidade santa; neste caso, o pão e o vinho
do culto de Santa Ceia instituído naquela ocasião por Ele, como memorial,
seria o pão asmo e o vinho não fermentado do culto de Ceia” (The Jewish
Encyclopaedia, edição 1904).
- No AT, bebidas fermentadas nunca deviam ser
usadas na casa de Deus, e um sacerdote não podia chegar-se a Deus em
adoração se tomasse bebida embriagante (Lv 10.9). Jesus Cristo foi o Sumo
Sacerdote de Deus do novo concerto, e chegou-se a Deus em favor do seu
povo (Hb 3.1; 5.1-10).
- O valor de um símbolo se determina pela sua
capacidade de conceituar a realidade espiritual. Logo, assim como o pão
representava o corpo puro de Cristo e tinha de ser pão asmo (isto é, sem a
corrupção da fermentação), o fruto da vide, representando o sangue
incorruptível de Cristo, seria melhor representado por suco da uva não
fermentado “Sabendo que não foi com
coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados da vossa vã
maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos pais, Mas com o
precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado”
(1Pe 1.18,19). Uma vez que as Escrituras declaram explicitamente que o
corpo e sangue de Cristo não experimentaram a corrupção (Sl 16.10; At
2.27; 13.37), esses dois elementos são corretamente simbolizados por
aquilo que não é corrompidos nem fermentado.
- Paulo determinou que os coríntios tirassem dentre
eles o fermento espiritual, isto é, o agente fermentador “da maldade e da malícia” porque
Cristo é nossa Páscoa (1Co 5.6-8). Seria contraditório usar na Ceia do
Senhor um símbolo da maldade, isto é, algo contendo levedura ou fermento,
se considerarmos os objetivos dessa ordenança do Senhor bem como as
exigências bíblicas para delas participarmos.
Amém!
Erivelton de Jesus
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